terça-feira, 30 de junho de 2009

Pequenas citações

AOS ESFARRAPADOS DO MUNDO
E AOS QUE NELES SE
DESCOBREM E, ASSIM
DESCOBRINDO-SE, COM ELES
SOFREM, MAS, SOBRETUDO,
COM ELES LUTAM.

(Paulo Freire, Pedagogia do Oprimido)
http://www.scribd.com/doc/16963665/Paulo-Freire-Pedagogia-do-Oprimido



"Assistimos ao esforço fantástico dos monopolizadores do ter, do saber e do poder para nos reduzir a simples galinhas. Para nos manter somente nos limites estritos do galinheiro e do terreiro. Para nos subordinar aos seus interesses. Eles são os principais responsáveis pelas ameaças de devastação e de autodestruição que pesam sobre a Terra e sobre toda a humanidade. Para continuar a usufruir dos privilégios usurpados, se fazem surdos ao clamor dos milhões e milhões de sofredores de todo o mundo e surdos ao grito lancinante da Terra. Atrevem-se a sufocar nossa águia interior, águia que nos impulsiona a gritar, a protestar, a resistir e a buscar caminhos de libertação."

(Leonardo Boff, A Águia e a Galinha)
http://www.scribd.com/doc/16963652/Leonardo-Boff-A-Aguia-E-A-Galinha

domingo, 14 de junho de 2009

sábado, 13 de junho de 2009

Desafio Ético

Ao viajar pelo Oriente, mantive contatos com monges do Tibete,
da Mongólia, do Japão e da China.
Eram homens serenos, comedidos, recolhidos em paz em seus
mantos cor de açafrão.
Outro dia, eu observava o movimento do aeroporto de São Paulo: a
sala de espera cheia de executivos,
com telefones celulares, preocupados, ansiosos, geralmente
comendo mais do que deviam.
Com certeza, já haviam tomado café da manhã em casa,
mas como a companhia aérea oferecia um outro café, todos
comiam vorazmente.
Aquilo me fez refletir: "Qual dos dois modelos produz felicidade?"
Encontrei Daniela, 10 anos, no elevador, às nove da manhã, e
perguntei: "Não foi à aula?"
Ela respondeu: "Não, tenho aula à tarde".
Comemorei: "Que bom, então de manhã você pode brincar, dormir
até mais tarde".
"Não", retrucou ela, "tenho tanta coisa de manhã..." "Que tanta
coisa?", perguntei.
"Aulas de inglês, de balé, de pintura, piscina", e começou a elencar
seu programa de garota robotizada.
Fiquei pensando: "Que pena, a Daniela não disse: "Tenho aula de
meditação!"
Estamos construindo super-homens e super-mulheres, totalmente
equipados, mas emocionalmente infantilizados.
Por isso as empresas consideram agora que, mais importante que o
QI, é a IE, a Inteligência Emocional.
Não adianta ser um super-executivo se não se consegue se
relacionar com as pessoas.
Ora, como seria importante os currículos escolares incluírem aulas
de meditação!
Uma progressista cidade do interior de São Paulo tinha, em 1960,
seis livrarias e uma academia de ginástica;
hoje, tem sessenta academias de ginástica e três livrarias!
Não tenho nada contra malhar o corpo, mas me preocupo com a
desproporção em relação à malhação do espírito.
Acho ótimo, vamos todos morrer esbeltos:
"Como estava o defunto?".
"Olha, uma maravilha, não tinha uma celulite!"
Mas como fica a questão da subjetividade? Da espiritualidade? Da
ociosidade amorosa?
Outrora, falava-se em realidade: análise da realidade, inserir- se
na realidade, conhecer a realidade.
Hoje, a palavra é virtualidade. Tudo é virtual.
Pode-se fazer sexo virtual pela internet: não se pega AIDS, não há
envolvimento emocional, controla- se no mouse.
Trancado em seu quarto, em Brasília, um homem pode ter uma
amiga íntima em Tóquio, sem nenhuma preocupação de conhecer o
seu vizinho de prédio ou de quadra!
Tudo é virtual, entramos na virtualidade de todos os valores, não
há compromisso com o real!
É muito grave esse processo de abstração da linguagem, de
sentimentos:
somos místicos virtuais, religiosos virtuais, cidadãos virtuais.
Enquanto isso, a realidade vai por outro lado, pois somos também
eticamente virtuais.
A cultura começa onde a natureza termina. Cultura é o
refinamento do espírito.
Televisão, no Brasil - com raras e honrosas exceções -, é um
problema:
a cada semana que passa, temos a sensação de que ficamos um
pouco menos cultos.
A palavra hoje é 'entretenimento' ; domingo, então, é o dia
nacional da imbecilização coletiva.
Imbecil o apresentador, imbecil quem vai lá e se apresenta no
palco, imbecil quem perde a tarde diante da tela.
Como a publicidade não consegue vender felicidade, passa a ilusão
de que felicidade é o resultado da soma de prazeres:
"Se tomar este refrigerante, vestir este tênis, usar esta camisa,
comprar este carro, você chega lá!"
O problema é que, em geral, não se chega!
Quem cede desenvolve de tal maneira o desejo, que acaba
precisando de um analista.
Ou de remédios. Quem resiste, aumenta a neurose.
Os psicanalistas tentam descobrir o que fazer com o desejo dos
seus pacientes. Colocá-los onde?
Eu, que não sou da área, posso me dar o direito de apresentar uma
sugestão.
Acho que só há uma saída: virar o desejo para dentro.
Porque, para fora, ele não tem aonde ir!
O grande desafio é virar o desejo para dentro, gostar de si mesmo,
começar a ver o quanto é bom ser livre de todo esse
condicionamento globalizante, neoliberal, consumista.
Assim, pode-se viver melhor.
Aliás, para uma boa saúde mental três requisitos são
indispensáveis:
amizades, auto-estima, ausência de estresse.
Há uma lógica religiosa no consumismo pós-moderno.
Se alguém vai à Europa e visita uma pequena cidade onde há uma
catedral, deve procurar saber a história daquela cidade - a
catedral é o sinal de que ela tem história.
Na Idade Média, as cidades adquiriam status construindo uma
catedral; hoje, no Brasil, constrói-se um shopping center.
É curioso: a maioria dos shopping centers tem linhas arquitetônicas
de catedrais estilizadas;
neles não se pode ir de qualquer maneira, é preciso vestir roupa
de missa de domingos.
E ali dentro sente-se uma sensação paradisíaca: não há mendigos,
crianças de rua, sujeira pelas calçadas...
Entra-se naqueles claustros ao som do gregoriano pós-moderno,
aquela musiquinha de esperar dentista.
Observam-se os vários nichos, todas aquelas capelas com os
veneráveis objetos de consumo, acolitados por belas sacerdotisas.
Quem pode comprar à vista, sente- se no reino dos céus.
Se deve passar cheque pré-datado, pagar a crédito, entrar no
cheque especial, sente-se no purgatório.
Mas se não pode comprar, certamente vai se sentir no inferno...
Felizmente, terminam todos na eucaristia pós-moderna, irmanados
na mesma mesa, com o mesmo suco e o mesmo hambúrguer do
McDonald's.
Costumo advertir os balconistas que me cercam à porta das lojas:
"Estou apenas fazendo um passeio socrático."
Diante de seus olhares espantados, explico:
Sócrates, filósofo grego, também gostava de descansar a cabeça
percorrendo o centro comercial de Atenas.
Quando vendedores como vocês o assediavam, ele respondia:
"Estou apenas observando quanta coisa existe de que não preciso
para ser feliz."
Frei Betto é escritor, autor, em parceria com Luis Fernando
Veríssimo e outros, de "O desafio ético" (Garamond).

fonte: http://www.scribd.com/doc/16117339/Desafio-Etico-Frei-Betto