segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Ser humano: poético e prosaico

Disse um dos mais inspirados poetas alemães Friedrich Hölderin (1770-1843):”é poeticamente que o ser humano habita a Terra”. Completou-o mais tarde um pensador francês, Edgar Morin: ”é também prosaicamente que o ser humano habita a Terra”. Poesia e prosa, além de gêneros literários, expressam dois modos distintos de ser.

A poesia supõe a criação que faz com que a pessoa se sinta tomada por uma força maior que ela, que lhe traz conexões inusitadas, iluminações novas, rumos novos.

Sob a força da criação, a pessoa canta, sai da rotina e assume caminhos diferentes. Emerge então o xamã que se esconde dentro de cada um, aquela disposição que nos faz sintonizar com as energias do universo, que capta o pulsar do coração do outro, da natureza e do próprio Deus. Por esta capacidade se desocultam supreendentes sentidos do real.

“Habitar poeticamente a Terra” significa senti-la como algo vivo, evocativo, grandioso e mágico. A Terra são paisagens, cores, odores, imensidão, fascínio e mistério.

Como não se extasiar diante da majestade da floresta amazônica com suas árvores quais mãos ao alto tentando tocar as nuvens, com o emaranhado de seus cipós e trepadeiras, com as nuances sutis de seus verdes, vermelhos e amarelos, com os trinados das aves e a profusão de frutos?

Como não se quedar boquiaberto diante da imensidão das águas que se espraiam mato adentro e descem molemente para o oceano? Como não sentir-se tomado de temor reverencial quando se anda horas e horas pela floresta virgem como me tocou várias vezes com Chico Mendes?

Como não se sentir pequeno, perdido, bichinho insignificante face à incontável biodiversidade?

Habitamos poeticamente o mundo quando sentimos na pele o frescor da manhã, quando padecemos sob a canícula do sol a pino, quando serenamos com o cair esmaecido da tarde, quando nos invade o mistério da escuridão da noite.

Estremecemos, vibramos, nos enternecemos, nos aterramos extasiados diante da Terra em sua inesgotável vitalidade e no encontro com a pessoa amada. Então todos vivemos o modo de ser poético.

Lamentavelmente, são cegos e surdos e vítimas da lobotomia do paradigma positivista moderno aqueles que vêem a Terra simplesmente como laboratório de elementos físico-químicos, como um conglomerado desconexo de coisas justapostas. Não. Ela é viva, Mãe e Pacha Mama.

Mas habitamos também prosaicamente a Terra. A prosa recolhe o cotidiano e o dia-a-dia cinzento, feito de tensões familiares e sociais, com os horários e os deveres profissionais, com discretas alegrias e disfarçadas tristezas.

Mas o prosaico esconde também valores inestimáveis, descobertos depois de longa internação num hospital ou quando regressamos, pressurosos, após penosos meses fora de casa.

Nada mais suave que o desenrolar sereno e doce dos horários e dos afazeres caseiros e profissionais. Temos a sensação de uma navegação tranquila pelo mar da vida.

Poético e prosaico convivem, se complementam e se revezam de tempos em tempos. Temos que zelar pelo poético e pelo prosaico de nossas vidas, pois ambos se complementam e estão ameaçados de banalização.

A cultura de massas desnaturou o poético. O lazer que seria ocasião de ruptura do prosaico foi aprisionado pela cultura do entretenimento que incita ao excesso, ao consumo de álcool, de drogas e de sexo. É um poético domesticado, sem êxtase, um desfrute e sem encantamento.

O prosaico foi transformado em simples luta darwiniana pela sobrevivência, extenuando as pessoas com trabalhos monótomos, sem esperança de gozar de merecido lazer.

E quando chega o lazer, ficam reféns daqueles que já pensaram tudo para elas, organizaram suas viagens e fabricaram-lhes experiência inesquecíveis. E conseguiram. Mas como tudo é artificialmente induzido, o efeito final é um doloroso vazio existencial. E ai tome depressivos.

Saber viver com leveza o prosaico e com entusiasmo o poético é indicativo de uma vida densamente humana.

Por Leonardo Boff.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Reflexões sobre as Árvores

As árvores nascem, crescem, se reproduzem e se transformam. Elas criam beleza e a arte em suas formas é inegável. Têm uma sabedoria acumulada de muitas gerações e as mais criativas maneiras de se adaptarem mostram uma arte única e deslumbrante aos olhos de um observador. São a casa de muitos seres e providenciam, além de abrigo do sol ou da chuva, alimentos fartos para a comunidade da Terra. Atraem diversidade, água, inspiração e conectividade com o misterioso. O que mais posso lhes dizer? O que mais elas precisam nos mostrar? Como podemos ver esses seres vivos evoluidíssimos como simples objetos materiais inferiores? Como uma parte da comunidade da Terra que não possui inteligência? Enquanto nós ditos pensadores fazemos guerras e mergulhamos em poços de futilidades sem fim para viver! Me desculpem os antropocêntricos mas no meu curto caminho de vida percebi que estes seres que chamamos de árvores, têm uma sabedoria anos luz a frente da nossa. Observe, contemple e interaja. Plantemos árvores para criar abundância de sabedoria na Terra, criar vida, criar arte, criar inspiração, criar recursos. Que habilidade maravilhosa que o misterioso nos deu, plantar e favorecer o crescimento de seres iluminados e sábios.

Abundância

O medo acabou, não precisamos mais dele. Sem ele teremos abundância, com abundância teremos amor. Esta aí na sua frente. Quebre as amarras do medo e verá. Saia do paradigma competitivo e vivenciará. Não mais terá barreiras. É simples sim. Não fiquemos encabulados com uma solução simples para problemas tão complexos. É simples sim! E a hora é agora. O fluxo começa a virar de direção e o caldo a engrossar. Velhos, jovens, crianças, mosquitos, macacos e pererecas. Todos um só. A consciência se elevará e viveremos uma vida de verdade, uma vida de luz, de paz, de presença, de espírito, de cooperação. É possível sim! Basta querer! Simples sim. Viva a abundância de espírito na vida.

Vida e Morte

Viver para que
Viver para vê
Vê o que
Vê a vida
O que é vida
A vida é viva
E o que está vivo
Tudo está vivo
E o que está morto
Tudo está morto
Como é estar vivo e morto
Sendo como as árvores
que estão sempre se renovando
com seus galhos, folhas e sementes
E depois sua madeira
na Terra
Se transformando em terra e vida
Muita vida
e a vida gera morte
e a morte
vida
vida e morte
morte e vida